Mesmo sem ter um coração para bombear, a Sequoia Vermelha (Sequoia sempervirens) consegue levar água e sais minerais das raízes até as folhas mais altas, que podem estar a mais de 110 metros de altura

– Por Eduardo Gonçalves 

As árvores são os organismos mais altos que já existiram. Algumas sequoias e eucaliptos ultrapassam 90 m de altura, algo nunca alcançado por nenhum animal terrestre – os mais altos dinossauros de que se tem notícia olharam o mundo a, no máximo, uns 18 m altura. Tal grandiosidade traz uma intrigante questão: se as plantas absorvem água e sais pelas raízes, como é que elas conseguem vencer a gravidade e levar essa água até as folhas mais altas se não contam com coração ou qualquer outro sistema de bombeamento? O aparente milagre acontece dentro de um conjunto de canos minúsculos feitos de células mortas chamado xilema.

Para que funcione, a planta precisa garantir uma coluna contínua de água nesses canos, da ponta da raiz até as folhas mais altas. A simples presença de uma bolha é o suficiente para estragar tudo  O conjunto de canos começa a se formar assim que a semente germina e se mantém funcionando durante toda a vida da planta. Aliás, é na tentativa de prolongar o funcionamento do xilema –  ainda que artificialmente – que as pessoas cortam os cabos das flores de arranjos florais sob água. Uma vez estabelecidos os dutos, as plantas usam as propriedades de uma substância incrível chamada… água! Parece trivial, mas a água é peculiar em sua química. Pelo seu tamanho, deveria ser um gás à temperatura ambiente, mas insiste em permanecer líquida. Isso porque suas moléculas possuem uma estranha atração umas pelas outras que as impede de saírem voando por ai.

Tal atração é suficientemente forte para aproximar as moléculas, mas não para fixa-las totalmente. Assim, elas acabam trocando de parceiros, como naquele passo de quadrilha no qual as pessoas passam de braço em braço. As plantas exploram bem essas propriedades. Dentro das folhas, a água cobre inteiramente a superfície das células, como uma película. Quando uma molécula dessa película é perdida por evaporação, surge a necessidade de repor o buraco deixado.

Uma nova molécula é puxada, trazendo consigo uma outra, que puxa uma terceira, e assim por diante. Como tudo está ligado ao xilema, a falta da primeira molécula vem puxando a água até chegar à raiz. A disponibilidade de água é maior na terra do que no ar, então,  fica fácil para a raiz mais – e os sais minerais que estão no solo sobem de carona. Essa mistura de água e sais que sobe pela planta é chamada de “seiva bruta”, e segue sempre esse mesmo caminho das raízes para as folhas. Se a água no solo ficar escassa, a planta fecha os poros que possui nas folhas – os chamados estômatos – e espera a situação melhorar.

Mas nem só de água e sais vive a planta. Quando as folhas estão bem supridas da seiva bruta, usam a luz do sol para gerar açúcares. Só que as folhas estão bem longe das raízes e outros órgão que precisam alimentar. Então, utilizam um outro sistema de tubos – o floema -, este efeito com  células vivas e que funciona de forma diferente: sempre manda água com açúcar – ou “seiva elaborada” – de onde sobra para onde está faltando, não importando a direção. A planta até precisa gastar alguma energia para empurrar o açúcar para dentro do floema, mas uma vez feito isso, ele flui naturalmente  para os outros tecidos famintos – inclusive para as raízes, que, enterradas, nunca veem a luz. Nada mal para organismos sem coração, não é?


Eduardo Gomes Gonçalves é paisagista, doutor em Botânica, autor do livro Se não fugir, é planta! e escreve sobre curiosidades do mundo da biologia


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