A paixão dos ingleses pelas plantas criou o Kew Gardens, um dos mais belos e importantes jardins botânicos do mundo

– Por Roberto Araújo

Um jardim precisa de tempo. O Royal Botanic Gardens Kew festeja 258 anos agora em 2017. Tem em sua riquíssima coleção plantas com histórias como a do Pinus nigra subsp. iaricio que, em seus 195 anos de vida, chegou a ser atingido por um pequeno avião e por dois raios.

Um jardim precisa de talentos. Mais de 200 cientistas trabalham em Kew, fora o batalhão de botânicos, jardineiros e muitos outros funcionários. E não é de hoje. Os exploradores de Kew rodam há séculos o mundo todo e influenciaram até a história brasileira. Para infelicidade dos barões da borracha da Amazônia, foram os cientistas de Kew que levaram 70.000 sementes de seringueira para a Inglaterra em 1876. Delas, só 2.800 germinaram mas foi com estas mudas que as seringueiras chegaram à Malásia e ao Sri Lanka decretando o fim do ciclo da borracha no Brasil.

Um jardim precisa de dinheiro. Ah, e isso não falta. Kew sempre foi um jardim para a alegria de monarcas e dos fanáticos jardinistas britânicos. Além da verba oficial, muita gente colabora para a glória desse incrível jardim botânico, especialmente agora nos festejos de seus 250 anos.

PALÁCIOS DE VIDRO

É verão em Londres. Verão para eles, entre 10 e 20 graus Celsius. Para nós brasileiros, é como se fosse inverno. E isso só faz aumentar o choque térmico ao entrar na Palm House. É aquele calorão de dezembro, nosso velho conhecido. Feita em ferro e vidros curvos, essa estufa construída em 1844 especialmente para o cultivo das plantas tropicais é um dos melhores exemplos da arquitetura vitoriana. O aquecimento do local, na época, era feito por caldeiras movidas à carvão, como ocorria nos navios. Hoje é a gás.

Pobre da Jubaea chilensis, a palmeira do vinho. Mesmo tendo sido plantada por semente num outro palácio de vidro chamado a Temperature house (algo como “casa da temperatura”), a planta cresceu demais, bateu no teto e, em breve, terá de ser substituída. Não, ninguém quis considerar a possibilidade de mexer no teto de vidro dessa estufa de 4.880 m2, construída em 1859.

BATENDO NO TETO

O que para os ingleses é mais que especial, deixa qualquer brasileiro desorientado. Buchas e rabos-de-gato são preciosidades que arrancam suspiros de admiração. Nas áreas externas também é comum deixar o capim crescer para contrastar com os gramados super bem penteados. Ou ainda explorar combinações de plantas de cores diferentes, caso da árvore Fagus Sylvatica var. purpurea com folhas cor de vinho, bem viva, com outra de folhas bem verdes. Exemplos de um paisagismo típico inglês, impecável na opinião deles.

JARDINS PARA PRINCESAS

Todo o paisagismo de Kew surgiu a partir do seu palácio, construído em 1631 – há 378 anos portanto. Ao longo do tempo, foi casa de muitas princesas. Uma delas, Augusta Carlota de Gales, foi quem fundou Kew Garden em 1759. É, portanto, em homenagem a ela que foi construída a estufa The Princess of Wales Conservatory (algo como o “conservatório da princesa de Gales”). Apesar de toda feita em metal e vidro, a estrutura tem estilo completamente diferente das outras estufas. É moderna, com dez zonas climáticas, todas controladas por computador, sobre um único teto. Para manter a tradição das princesas, foi inaugurada pela falecida princesa Diana em 1987.

COMO NO DESERTO

Se na Palm House o calor é úmido, dentro do Princess of Wales Conservatory é o ar seco que impera. Alegria de cactos e suculentas que foram cuidadosamente plantados como se estivessem em seus hábitats. Como em todo o jardim, cada planta merece o maior respeito e consideração. Se um cacto gosta de vento quente, nada mais justo que canalizar um vento quente para ele. O respeito pela Natureza também não se mede em tamanho. Na pedra porosa, dezenas de minúsculas plantas. Em algumas a gente só percebe que tem uma espécie ali devido à placa identificadora. Não cheguei a ver, mas no inverno, enquanto a neve cobre o conservatório pelo lado de fora, dentro os cactos continuam se refestelando no calor sem qualquer umidade da estufa.

ÁRVORES, MUITAS ÁRVORES

Estranha, diferente, enorme, o Fagus silvatica var. pendula forma uma espécie de cabana em seu interior. E ela é apenas uma das 14 mil árvores que existem em Kew. Também pudera, a área do jardim é enorme, com 1.320.000 m2 (cerca de 132 hectares). Para permitir aos visitantes observarem melhor as árvores desde o ângulo de suas copas existe o Tree top Walkway (“um passeio pelo topo de árvores”), um caminho aéreo a 18 m de altura que torna possível a observação bem de perto também dos frutos, pássaros ou insetos.

Existem 25 prédios ornamentais em Kew. Um dos mais interessantes é o Pagoda, construído em 1762 em homenagem à princesa Augusta, a criadora de Kew. Com seus 50 m de altura, é emoldurado pelo antigo cedro-do-líbano (Cedrus libani).

 

 

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