História, sabor e propriedades nutricionais fazem do caqui uma fruta pra lá de especial

TEXTO ANA LUÍSA VIEIRA | FOTOS VALERIO ROMAHN

Pode até parecer exagero, mas a alcunha de alimento dos deuses é tão forte no caso do caqui (Diospyros kaki) que aparece até no nome científico da espécie – em grego, diospyros significa alimento dos deuses. Se ela tem a ver com o sabor adocicado da fruta ou com suas inúmeras propriedades medicinais, não se sabe ao certo. O fato é que o caquizeiro é cultivado no território asiático há séculos e aparece, inclusive, em uma lenda popular japonesa. Conta a história que o samurai Minamoto Yoshitsuné, herói do país no século 12, derrubou um gigante com tamanha intensidade que até abriu um buraco na terra. Da fenda, brotou uma árvore carregada de frutos vermelho-alaranjados cuja polpa saborosa devolveu ao lutador toda a energia que ele havia perdido no combate. A fruta, claro, era o caqui.

O caqui é cultivado na Ásia há séculos e já foi até personagem de lenda popular

Um oriental bem brasileiro

No Brasil, a história do cultivo do caqui se mistura à da imigração japonesa. Nos anos 1920, os orientais que desembarcaram por aqui traziam na bagagem mudas da espécie e sólidos conhecimentos sobre seu cultivo, e iniciaram a produção em fazendas que antes se restringiam ao plantio de café.

Até então, as únicas variedades de caqui conhecidas por aqui eram as adstringentes, que haviam chegado a São Paulo no final do século 19, vindas da França, e cujo sabor não era muito agradável. Docinhos, os cultivares vindos do Japão logo caíram no gosto popular. A planta, por sua vez, apreciou o clima e o solo brasileiros e passou a ser cultivada, principalmente, nos estados de São Paulo, Paraná, Rio Grande do Sul e Santa Catarina.

Hoje, a produção é tão grande que o país até exporta o fruto. São mais de dez as variedades produzidas por aqui, entre as quais chocolate, fuyu, hachiya e jirô, de sabor doce, e giombô, kyoto, taubaté e rama forte, mais adstringentes, que precisam de tratamento após a colheita para se tornarem comestíveis.

Adstringente e nutritivo

O que determina a adstringência na polpa de alguns tipos de caqui é a presença do tanino – substância que “amarra a boca” de quem abocanha o fruto. Na Natureza, ele tem a função de afastar herbívoros e microorganismos nocivos.

Característica comum a todos os cultivares é o alto teor de açúcar, com concentrações que variam entre 14% e 18%. Por esse motivo, é recomendada moderação no consumo do caqui – que costuma ser feito in natura ou em pratos doces –, especialmente para os diabéticos. Assim como a maior parte dos vegetais de cor amarelo-alaranjada, o caqui é rico em betacaroteno, que atua como antioxidante e combate a formação de radicais livres. As fibras visíveis em sua parte carnosa ainda contribuem para o bom funcionamento do intestino. O fruto também é fonte de sais minerais como cálcio, ferro e fósforo; e de vitamina C – que, entre vários benefícios, protege contra a baixa imunidade e combate doenças cardiovasculares.

Metamorfose no pomar

Além de produzir frutos saborosos, o caquizeiro é uma árvore que dá um show de ornamentalidade. Sua copa grande e arredondada pode chegar a até 12 m de altura e fica totalmente despida de folhas no inverno. Primeiro, elas adquirem uma coloração avermelhada e, depois, literalmente caem por terra, deixando a árvore desnuda em meio à paisagem. O visual dura até setembro, quando as lâminas renascem verdes para, no mês seguinte, ganharem a companhia de pequenas flores amarelas. Das flores, por sua vez, nascem os frutos, que podem ser colhidos de março até o fim do outono.

Segundo Ercílio Hoçoya, produtor em uma fazenda onde o caqui é cultivado desde meados da década de 1960, um bom cultivar para quem quer ter a frutífera em casa é o rama-forte, que não necessita de muitos cuidados e cresce bem em áreas de 30 m² a 40 m². O segredo é colher as frutas só quando elas estiverem bem vermelhas e com a consistência mole – estado em que boa parte do tanino já se perdeu.

Mesmo que você escolha outra variedade, dificilmente terá problemas, pois o caquizeiro é rústico, de fácil adaptação climática e que exige pouco de quem o cultiva: só mesmo um pouco de paciência, já que os primeiros frutos só aparecem três anos depois do plantio.

O caquizeiro começa a frutificar três anos após o plantio

Caqui em detalhes

  • Nome popular: caqui, caquizeiro
  • Nome científico: Diospyros kaki
  • Família: ebenáceas
  • Origem: Ásia
  • Características: árvore perene, de folhas caducas, com copa ramificada e alta capacidade de adaptação climática
  • Folhas: lisas, lustrosas, com textura de couro na parte superior e aveludada na parte inferior. O comprimento varia de 8 cm a 25 cm. No inverno, adquirem coloração avermelhada
  • Flores: pequeninas e amarelas, contam com quatro pétalas e aparecem na primavera
  • Frutos: surgem no outono, e o formato e o tamanho variam conforme o cultivar. Normalmente, têm casca amarelo-alaranjada. A polpa suculenta, cuja cor varia entre amarelo, laranja e marrom, tem sabor doce e pode conter tanino, que deixa na boca uma sensação adstringente
  • Luz: sol-pleno
  • Solo: profundo e bem drenado, com pH entre 5,5 e 6
  • Clima: subtropical ou temperado quente
  • Plantio: o produtor Guilherme Andrinus recomenda preparar o solo colocando 20 litros de esterco de curral em berços de 60 cm x 60 cm x 60 cm. As mudas com raízes nuas devem ser plantadas no fim do inverno. Já se elas tiverem torrão é melhor plantar no período de chuvas
  • Regas: uma vez por semana na estiagem
  • Adubação: o produtor Ercílio Hoçoya recomenda duas aplicações de 500 g de NPK 9-0-24 durante o crescimento dos frutos. Uma vez por ano, incorpore à terra de 20 a 30 litros de esterco de curral curtido
  • Podas: de formação durante os três primeiros anos e, depois disso, no inverno para a remoção dos ramos secos
  • Propagação: por sementes, estaquia das pontas dos ramos ou enxertia
  • Pragas e doenças: entre novembro e dezembro, a planta pode ser atacada por um fungo chamado cercospora, que deixa as folhas com pintas brancas. O melhor remédio é a calda bordalesa, vendida em casas agropecuárias
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