Remanescente de um grupo de plantas extintas há 65 milhões de anos, a ginco-biloba é considerada um fóssil vivo

TEXTO GABI BASTOS

Há mais de 300 milhões de anos, antes mesmo de os dinossauros habitarem o planeta, espécies da família das ginkgoáceas ornamentavam a Terra com seu porte majestoso. Todas foram extintas há 65 milhões de anos, com exceção de uma: a ginco-biloba (Ginkgo biloba).

Na Natureza, essa árvore só é encontrada no Sudeste asiático, de onde é nativa. Mede cerca de 30 m de altura e sofreu poucas alterações estruturais ao longo dos milênios. “Alguns fósseis indicam que as folhas da ginco-biloba eram formadas por folíolos – pequenas folhas – separados, que gradativamente foram se unindo até compor as folhas em forma de leque que observamos hoje”, diz Tânia Lindner Dutra, paleontóloga da Unisinos (Universidade do Vale do Rio dos Sinos, RS).

Por não se reproduzir por pinhas e obedecer ao ritmo das estações do ano, perdendo as folhas no inverno, a ginco-biloba não pode ser considerada uma conífera – outro tipo de planta pré-histórica. Ela também não floresce e nem frutifica como a maioria das árvores. “A espécie apresenta lindas estruturas reprodutivas masculinas e femininas que até lembram frutos e flores, mas não o são”, diz Tânia. Trata-se de uma planta única, considerada um fóssil vivo por Darwin, pai da teoria da evolução.

Embora seja extremamente resistente, acredita-se que a ginco-biloba só sobreviveu nos últimos milênios porque contou com a ajuda da humanidade para se multiplicar. Por ser considerada sagrada, a espécie foi amplamente cultivada no Oriente.

Na China, a planta é um símbolo do Yin e Yang – filosofia que acredita na dualidade do mundo. Já no Japão, é conhecida como i-cho, que quer dizer “folhas com pés de pato” e está relacionada à iluminação de Buda. Tanto que seu plantio na entrada de templos é praticamente obrigatório até hoje.

No Ocidente, a ginco-biloba foi descrita pela primeira vez em 1865, pelo botânico alemão Engelbert Kaempfer, e logo chamou a atenção do conterrâneo Johann Wolfgang von Goethe, famoso escritor, filósofo e botânico. Inspirado na espécie, ele escreveu um poema para sua amada Marianne von Willemer.

Mas a espécie só ficou mundialmente conhecida depois de resistir à bomba atômica jogada em Hiroshima, no Japão, em 1945, durante a Segunda Guerra Mundial. Bastaram oito meses para que ela voltasse a brotar no solo da cidade devastada, a apenas 1 km do centro da explosão. Uma dessas árvores ainda pode ser apreciada na entrada de um centro budista de Hiroshima – reconstruído com uma escada em forma de ‘U’ só para preservá-la. Por ter resistido ao ataque, a ginco-biloba passou a ser um símbolo da paz mundial.

À esquerda, Ginco-biloba do Jardim Botânico de Stuttgart, na Alemanha, fotografada na primavera. à direita, A Ginkgo Avenue, no Japão, vira ponto turístico no outono, quando as gincos ficam douradas.

Sua imunidade à radioatividade, à poluição industrial e a infestações de insetos, bactérias e alguns tipos de fungos levou cientistas e pesquisadores a estudar as gincos. Desde então, a espécie ganhou destaque na fitoterapia devido às características químicas de suas folhas e frutos, que melhoram as funções cognitivas, aquelas ligadas à memória e à atenção. Da planta, também é extraída uma substância rica em vitaminas usada na cosmética para retardar o envelhecimento.

COMO CULTIVAR

O nome Ginkgo biloba é uma alusão às características da espécie. Em chinês, Ginkgo significa “damasco prateado’” e se refere aos frutos da planta. Já biloba é uma alusão ao formato das folhas, que parecem ter dois lóbulos.

Grande responsável pela beleza da planta, a folhagem fica, literalmente, amarelo-dourada no outono. E o colorido continua no solo durante o inverno, quando as folhas se desprendem e formam um tapete sob a copa da espécie.

As folhas da ginco-biloba têm formato peculiar que parece o de pequenos leques

Mesmo tão ornamental, a ginco-biloba não é muito utilizada no paisagismo por dois motivos: seu crescimento lento – ela demora cerca de cinco anos para alcançar 2 m de altura – e a exigência de frio para se desenvolver. “Quanto mais baixa a temperatura, melhor”, diz Ronan Machado, engenheiro agrônomo do viveiro Trees, produtor da espécie.

O aspecto da planta se modifica à medida que o tempo passa. Quando jovem, a especie apresenta tronco cinza e sua copa é arredondada e formada por ramos escassos. Conforme envelhece, seu tronco fica mais sulcado e sua copa mais densa e afunilada.

Em outros tempos, a ginco chegou a crescer até 80 m de altura. Hoje, as mais antigas medem entre 30 m e 40 m. Sua multiplicação pode ser por sementes ou por estaquia. “As produzidas por sementes são mais interessantes, pois variam geneticamente no porte, desenvolvimento e resistência a pragas, entre outros aspectos. Já as produzidas por estaquia crescem mais rápido”, explica Ronan.

No plantio, o ideal é adquirir mudas com cerca de três anos acondicionadas em vasos para facilitar o transplante para o local definitivo. Ela deve ser cultivada em cova 30% maior que o torrão das raízes, em substrato preparado com partes iguais de terra de jardim e composto orgânico. Nos três primeiros meses, para ajudar a planta a se adaptar ao novo ambiente, é indicado regar o solo sempre que ele estiver seco. “Para mudas de cerca de 50 cm, 4 litros de água a cada dois ou três dias são suficientes. Em plantas maiores – 2 m ou 3 m – as regas precisam ser diárias”, dá a dica Ronan Machado. Para a copa da ginco-biloba ficar mais alta e bem formada é aconselhável podar os ramos inferiores e malformados nos primeiros anos, até alcançar o resultado desejado.

É preciso ter paciência para acompanhar o crescimento da ginco-biloba, mas o resultado é muito compensador. A espécie dará um espetáculo colorido e esplendoroso para, no mínimo, três gerações de uma família.

Exemplar da ginco-biloba sobrevivente
à bomba atômica

Ginkgo
biloba

Esta árvore nascida no Oriente
E que repousa agora em meu jardim
Sussurra a nós, secretamente
Leves mistérios de saber sem fim
Seria sua folha um vivo ser, que um dia
Em duas metades quis se repartir?
Ou eram dois, que em decisão tardia
Em um apenas se quiseram unir?
Pus em minha alma então meditações
E seu segredo desvendei depois
Você notou, que em versos e canções
Às vezes eu sou um, às vezes dois?
Poema de Goethe, escrito
em 1875. Acima aparece
o escrito original

– Goethe, 1875

 

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