Texto: Luiz Mors Cabral

Foi há 385 milhões de anos que a primeira árvore conhecida, a Wattieza, começou a longa jornada que criou o ecossistema que dura até hoje

Todo mundo sabe o que é uma árvore: uma coisa grande e lenhosa que fornece sombra, madeira e, eventualmente, frutas. Todos são capazes de desenhar uma árvore, ou dizer de cabeça o nome de algumas delas. Carvalhos, pinheiros, amendoeiras, mangueiras fazem parte do imaginário de quase todas as pessoas.

Se a pergunta for feita a um botânico, no entanto, a definição será mais técnica. Uma árvore é qualquer planta com uma estrutura autosustentável e um caule lenhoso perene (ou seja, um caule que vive por um longo período).

Mas mesmo essa definição é um pouco falha, já que todas essas características também estão presentes em arbustos que não são árvores. Vale acrescentar algumas informações para de fato descrever o que é uma árvore. As árvores se ramificam a alguma distância acima do solo, enquanto um arbusto tem múltiplas ramificações bem próximas ao chão, além de serem, de forma geral menores.

As plantas deixaram a água e começaram a ocupar as porções de terra há aproximadamente 470 milhões de anos, mas naquele momento não havia nenhuma que pudesse ser considerada uma árvore verdadeira. Essas primeiras plantas terrestres eram adaptações de algas e ainda não possuíam sistema vascular, raiz, caule ou folhas.

Para se elevar do solo, as plantas enfrentaram problemas biomecânicos muito complexos para se tornarem capazes de suportar peso adicional. A arquitetura da árvore moderna apresenta um acúmulo de anéis concêntricos que, conforme a árvore cresce verticalmente, vão conferindo mais resistência ao tronco, suportando altura e peso cada vez maiores. Demorou quase cem milhões de anos para que esses desafios fossem superados.

Já no século 19 os artistas davam asas à imaginação e desenhavam como seriam as florestas primordiais. Depois vendiam como cartões-postais / Imagem: Wikimedia

Em 1870, na região de Gilboa, no estado de Nova York, foram encontrados vários troncos fossilizados, ainda na posição vertical. Era uma floresta pré-histórica que foi datada como sendo do período Devoniano Médio. O problema é que o registro fóssil não se mostrou por inteiro. O material encontrado correspondia à base das plantas, e, embora tudo indicasse que elas fossem plantas altas, com troncos relativamente largos na base e presença de raízes vigorosas, a ausência da parte aérea da planta tornava impossível para os cientistas desvendar exatamente como era aquela planta originalmente. Esse mistério durou quase 140 anos, até que em 2007 dois fósseis espetaculares foram encontrados a somente treze quilômetros da floresta fossilizada descoberta em 1870.

Um dos fósseis estava bastante completo e permitiu a reconstrução de uma planta alta, com aproximadamente 8 metros de altura, um tronco com grandes ramos de folhas na parte superior, parecidas com folhas de samambaias, e centenas de pequenas raízes para a ancoragem. Esses fósseis eram as peças que faltavam em um quebra-cabeças que vinha sendo montado desde 1870. Os espécimes encontrados forneceram uma nova visão sobre as primeiras árvores e ecossistemas florestais da Terra, e deram origem ao gênero Wattieza, parentes antigos das samambaias, que fizeram a proeza de se elevar da terra para buscar a primazia na captação de luz a cerca de 385 milhões de anos atrás.

Imagem: Wikimedia
Imagem: Wikimedia

O surgimento das árvores resultou em modificações dramáticas para o planeta. Além de proporcionar vastidões sombreadas, elas passaram a ser habitat e proteção de diversas espécies, o que gerou microambientes e nichos ecológicos. Além disso, elas trouxeram mudanças em uma escala global.

A deposição sazonal de folhas e galhos, e o próprio tamanho das árvores, resultaram em uma captura de CO2 em quantidades gigantescas, reduzindo a temperatura e alterando de forma definitiva a atmosfera terrestre. Também os resíduos gerados pelas árvores garantiam alimento para uma série de organismos que passaram a viver no novo e abundante ecossistema das florestas. Um ecossistema tão rico que está presente até hoje, atravessando todas as transformações do nosso planeta e permanecendo fundamental para a vida.

O ESPECIALISTA

Essa reportagem foi publicada na edição 423 da Revista Natureza. Para adquirir, clique aqui.

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