No jardim, existe uma infinidade de plantas saborosas e nutritivas que podem ir à mesa e você nem desconfiava. Conheça algumas delas

Texto Marina Gabai 

Fotos Valério Romahn

Flores como salada e folhas refogadas: são vários os usos da celosia na cozinha

Olhe bem para o jardim. Mas não com aquele olhar contemplativo, que se encanta com a beleza das flores que acabaram de desabrochar, ou das folhagens cheias de formas e texturas sempre prontas a surpreender. Dessa vez o desafio é encontrar em meio às espécies ornamentais – e também junto daquelas daninhas, que vez ou outra brotam sem serem convidadas – as chamadas PANCs (Plantas Alimentícias Não Convencionais). São plantas nutritivas e cheias de sabor que podem fazer parte da salada do dia a dia ou da receita gourmet do fim de semana, mas que, por não serem encontradas na feira ou na prateleira do supermercado, muita gente nem desconfia que são comestíveis. “O universo das PANCs é gigante, mas muito pouco explorado. Descobrir e difundir seu potencial pode ajudar na recuperação do meio ambiente e na geração de emprego e renda para muita gente”, explica o prof. Dr. Valdely Ferreira Kinupp, autor do livro Plantas Alimentícias Não Convencionais (PANC).
O jeito mais fácil de começar a se familiarizar com essas espécies é procurando por elas aí mesmo, nos canteiros e vasos do seu jardim, onde pode estar crescendo, por exemplo, a celosia (Celosia argentea) (1). Além de deixarem a paisagem muito mais atraente, as delicadas inflorescências cor-de-rosa e folhas arroxeadas da espécie podem fazer bonito na cozinha. As folhas, quando refogadas, têm um sabor que lembra o espinafre, e as inflorescências, que surgem o ano todo, ficam deliciosas em saladas. A dica da herborista Gabriela Pastro é consumir as flores ainda novas, quando estão mais saborosas. Das flores maduras ainda se desprendem pequenas sementes pretas muito nutritivas, que lembram a quinua e podem ser adicionadas em diversas preparações, como arroz e omelete.

Flores como salada e folhas refogadas: são vários os usos da celosia na cozinha

A capuchinha (Tropaeolum majus) (2) é outra que agrada nos jardins e nos pratos. Enquanto nos canteiros suas flores encantam pelo colorido – vão do branco ao vermelho, passando por tons de amarelo e laranja –, na cozinha é o sabor picante, parecido com o do agrião, que faz sucesso. Tanto as flores quanto as folhas podem ser consumidas cruas em saladas ou cozidas, além de entrarem em receitas de tortas, pizzas e patês. Os botões florais e os frutos, por sua vez, são preparados em conserva e usados com se fossem alcaparras. Por fim, as sementes tostadas e moídas são ótimas substitutas para a pimenta-do-reino.

A mesma ora-pro-nóbis que se enche de belas flores produz folhas ricas em proteínas que vão bem na salada e até na massa da pizza e do pão

As folhas da ora-pro-nóbis (Pereskia aculeata) (3) também podem ir direto para a cozinha. Versáteis, elas são usadas em saladas, refogados, sopas e podem até enriquecer massas de pães, pizza e macarrão, já que são muito ricas em proteínas. Apesar de a espécie ser considerada não convencional em grande parte do território brasileiro, em Minas Gerais seu potencial culinário é muito conhecido há tempos.

MATO DE COMER

Além de não serem reconhecidas como possíveis integrantes do caderno de receitas, algumas PANCs que esbanjam sabor são vistas com maus olhos pelos jardinistas por conta de seu aspecto de mato. “São espécies invasivas, daquelas que brotam sozinhas em todo lugar”, diz Kinupp.

Ingeridas principalmente ao natural ou refogadas, as folhas da erva-jabuti e do caruru (acima) podem ser incorporadas a massas. As da urtiga (à direita) vão bem até empanadas

A erva-jabuti (Peperomia pellucida) (4), que tem folhas pequenas e bem verdes, e o caruru (Amaranthus spp.) (5), que faz sucesso na região Nordeste e é facilmente encontrado em feiras livres de vários países da América Central, são duas delas: podem ser consumidas in natura ou refogadas, além de serem boas opções para incorporar no preparo de massas. Do caruru ainda é possível comer as sementes misturadas ao arroz ou à vitamina.

Enquanto o sabor da folha da taioba lembra o da couve, o rizoma da espécie pode ser preparado cozido

A urtiga (Urtica dioica) (6) – assim como todas as espécies da família das urticáceas –em vez de ser simplesmente
arrancada do jardim, deveria virar ingrediente de receitas, seja como substituta do espinafre ou até empanada.
Para reduzir sua picância, a dica é ferver as folhas antes de usar. A exuberante taioba (Xanthosoma sagittifolium) (7) surge nos canteiros sem ser convidada, mas é muito bem-vinda na cozinha. Cortada e refogada, sua folha é uma excelente substituta para a couve; o pecíolo pode ser preparado em conserva, como o palmito; e o rizoma, cozido. A beldroega (Portulaca oleracea) (8), por sua vez, tem folhas pequenas e suculentas muito ricas em ômega 3, algo incomum em vegetais. Vai bem em saladas, sopas e sucos.

Raro de se encontrar em vegetais, o ômega 3 aparece em grande quantidade nas folhas da beldroega

CERCADAS DE ÁGUA

Nem só na terra vivem as PANCs. Algumas algas, plantas aquáticas e espécies que crescem em áreas alagadas também fazem parte do grupo de comestíveis que fogem do convencional. A alface-do-mar (Ulva lactuca) (9) já traz no nome a pista de seu uso culinário: pode ser consumida em saladas, como a alface; ou cozida, em sopas. Independentemente do método escolhido, os benefícios da alga para a saúde são grandes: ela tem altos teores de vitaminas A e C.

 A exuberante vitória-régia (Victoria amazônica) (10) é outra que faz bem ao corpo e ao paladar. Suas flores, que encantam os olhos, são deliciosas mesmo cruas, e ainda podem servir de ingrediente para geleias. O talo e os caules
substituem o aspargo e o palmito e as sementes, quando aquecidas, estouram como pipoca.

Pode acreditar: o grupo das espécies comestíveis não convencionais inclui até aquáticas como a vitória-régia (acima) e algas como a alface-do-mar (à direita)

Assim como acontece com a espécie amazônica, quase todas as partes da taboa (Typha domingensis) (11) podem ser aproveitadas. Encontrada em regiões alagadas, a planta produz inflorescências cujo pólen pode virar farinha; e o miolo de seu caule, que lembra muito o palmito, pode ser preparado em conserva. É, a Natureza é mesmo generosa, e novos ingredientes para suas receitas podem estar ali mesmo, no canteiro na frente de casa.

Do pólen das flores da taboa é extraída uma farinha, e o miolo de seu caule pode ser preparado em conserva, como o palmito

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