Da melancia amarela à cenoura roxa,  conheça as frutas e hortaliças cujas cores
fogem do lugar-comum 

– Por Ana Luísa Vieira

A paleta de cores com que a Natureza pinta os vegetais é mais extensa do que se imagina: muitas vezes, o mesmo fruto ou hortaliça pode ser colhido em diferentes tons, ainda que apenas uma variedade carregue a fama da espécie. Nesta reportagem, você vai ser apresentado a versões pouco conhecidas de figurinhas carimbadas em hortas, pomares e mesas de refeições – a começar pelas frutas.

POLPAS COLORIDAS

Por fora, parece uma melancia (Citrullus lanatus) qualquer: o formato arredondado, o tamanho avantajado, a casca lustrosa com estrias em tons de verde-claro e verde-escuro… Por dentro, o colorido surpreende: em vez do vermelho característico, a polpa é tomada por um amarelo quase fluorescente. Pouco comum, a melancia amarela tem menor teor de açúcar e consistência mais crocante do que sua prima vermelha – motivos pelos quais teve seu cultivo tão renegado ao longo dos anos.

A boa notícia é que hoje em dia algumas empresas agrícolas vêm desenvolvendo cultivares de polpa amarela tão tenras e adocicadas quanto as avermelhadas. “A diferença é que as primeiras apresentam maiores índices de betacaroteno – pigmento natural que dá a coloração amarelada ou laranja de algumas hortaliças e, no corpo humano, se converte em vitamina A”, explica Flávio de França Souza, pesquisador em genética e melhoramento vegetal na Embrapa Semiárido. A organização é responsável pelas amarelas BRS Soleil e BRS Kuarah, cujas sementes ainda são comercializadas em pequena escala no território nacional.

Os kiwis Actinidia chinensis também contam com uma casca tão marrom e felpuda quanto a das famosas espécies de polpa verde da fruta, chamadas de Actinidia deliciosa. Seu interior, no entanto, é amarelado – resultado das  baixas concentrações de clorofila. Em relação ao gosto, pouca coisa muda: “O kiwi amarelo tende a ser um pouco mais doce”, comenta o pesquisador Samar Velho, da Embrapa Uva e Vinho.

O baixo teor de clorofila deixa a polpa do kiwi Actinidia chinensis amarelada. O sabor também é mais doce do que o do kiwi comum

PRETO NO BRANCO

Preto e branco, os extremos da paleta de cores, também colorem plantas que marcam presença diariamente na mesa de refeições. O arroz (Oryza sativa) é prova disso: mesmo que seus grãos em tons esbranquiçados sejam os mais utilizados na culinária, a Natureza é ainda capaz de produzi-los em versões amarelas, vermelhas e negras. Nesse último caso, a responsável pela coloração é a antocianina, pigmento natural encontrado em frutas, flores e outras porções escuras dos vegetais. No organismo humano, ela funciona como um poderoso antioxidante. No sabor, imprime ao arroz negro um toque amendoado.

A mesma antocianina se faz presente no milho-negro (Zea mays) – que, embora seja pouco conhecido em solo brasileiro, em países como o Peru é tão famoso quanto o milho-verde. Lá, os grãos arroxeados são a base do preparo da chicha morada, bebida popular que também leva cravo, canela, abacaxi e cascas de maçã. Os peruanos garantem que não existe melhor refresco para os dias quentes.


No lado oposto do espectro das cores, o branco é quem dá o tom de hortaliças que, às vezes, são mais conhecidas pelos brasileiros em versões de colorido vibrante. É o caso da beterraba-açucareira (Beta vulgaris), ou beterraba-sacarina, variedade esbranquiçada da mesma espécie que, no Brasil, é encontrada apenas em tons de púrpura. Na França, a hortaliça – que tem sabor mais adocicado e raízes mais compridas do que os cultivares roxos – é utilizada, como o próprio nome popular sugere, para a extração de açúcar. Foi a alternativa encontrada pelos franceses no século 19, quando uma guerra marítima com a Inglaterra dificultou a importação de cana, que vinha da América Central.

DO PÚRPURA AO LARANJA

Hoje em dia, quem vê o laranja vibrante das cenouras (Daucus carota) comuns nem imagina que as precursoras da espécie eram roxas. Pois é: mais de cinco mil anos atrás, cenouras de casca púrpura – algumas quase pretas – nasciam espontaneamente nas terras da Ásia Central, onde também podiam ser colhidas variedades amarelas e esbranquiçadas da hortaliça. Aos poucos, os povos que habitavam a região domesticaram o cultivo da planta. Por fim, levaram suas raízes coloridas até as margens do Mediterrâneo e, de lá, para a Europa.

As cenouras originais eram mais finas, espigadas e amargas do que as atuais, que só começaram a ser desenvolvidas na Holanda entre os séculos 16 e 17. Há quem diga que os holandeses investiram na
produção massiva de cultivares ricos em betacaroteno – pigmento
natural que dá a coloração alaranjada de alguns vegetais – para homenagear Guilherme I, também conhecido como Príncipe de Orange, que governava os Países Baixos àquela época. Mito ou verdade, o fato é que a cenoura laranja – mais robusta e adocicada – ganhou fama e agora impera em hortas e mesas de refeições mundo afora.

Diz a lenda que a cenoura laranja foi desenvolvida na Holanda, para homenagear o Príncipe de Orange. Por ser mais doce, ela fez as cenouras de outras cores perderem espaço

 

 

 

 

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