– Por Ana Luíza Vieira | Fotos Valerio Romahn
Marcantes no sabor e exuberantes nas cores. Assim são as pimentas. Não à toa, as peculiaridades destas plantas condimentares já atraíam os povos indígenas antes mesmo do descobrimento das Américas – acredita-se que a civilização maia tenha sido precursora dos primeiros cultivares. Fato é que, quando chegou ao Novo Mundo no século 15 em busca de pedras preciosas e especiarias alternativas à pimenta-preta – ou pimenta-do-reino, da qual os europeus eram fãs à época –, Colombo logo se rendeu às iguarias picantes que os índios cultivavam. Gostou tanto que, na volta, levou algumas mudas para o Velho Continente.
O sucesso das pimentas por lá foi instantâneo: em pouco tempo, o cultivo dos frutinhos chegou à Índia e se espalhou pela África e pela Ásia. Cruzamentos e melhorias genéticas se sucederam e, hoje, a pimenta coleciona dezenas de cultivares – diversos em tamanho, formato, cor e, principalmente, sabor. Todos pertencem à família das solanáceas – a mesma da batata, da berinjela e do tomate – e ao gênero Capsicum, cujo nome alude à capsaicina, substância que produz aquela sensação ardente ao paladar de quem consome os frutinhos.
ARDUME DO BEM
O teor picante das pimentas fica concentrado na membrana que envolve as sementes. E, se hoje esse sabor ardido tem tantos apreciadores, parece até graça afirmar que, um dia, a capsaicina foi o jeito que a Natureza encontrou para evitar o consumo das pimentas por parte dos mamíferos. É que, para o bem da continuidade da espécie, o ideal seria que os pássaros – a quem o ardume não incomoda – comessem as sementes para depois espalhá-las.
No estômago dos mamíferos, os grãos perdem sua capacidade de germinação. Mecanismos de reprodução à parte, certo é que poucos fãs da capsaicina sabem do bem que ela faz: a substância tem propriedades analgésicas, anti-inflamatórias e ainda combate o envelhecimento celular. É rica em betacaroteno, vitaminas A, B e C, e, de quebra, estimula o cérebro a produzir endorfina – hormônio associado à sensação de bem-estar.
PARA TODOS OS GOSTOS
Dos diversos cultivares de pimenta existentes, o produtor rural Marcelo Cury planta cerca de 20 na Fazenda Ituaú, localizada em Salto, no interior de São Paulo. Lá, há desde exemplares da famosa ‘Habanero’ – consumível em diversas cores – até as excêntricas ‘Mushroom’ (cogumelo), ‘Carrot’ (cenoura) e ‘Pitanga’ – cujos formatos lembram, é claro, os elementos e frutos que emprestam os nomes às pimentas. A produção da fazenda ainda abrange tipos bastante ardidos – caso da ‘Bhut Jolokia’, que já ostentou o título de mais forte do mundo e só pode ser comprada sob encomenda – e mais suaves – como a jalapeño, uma das mais populares no México e facilmente encontrada em hortifrútis e supermercados brasileiros.
Para medir o grau de ardume das diversas pimentas do gênero Capsicum, os especialistas usam a escala de Scoville – que classifica cada pimenta de acordo com “unidades de calor” chamadas SHU (Scoville Heat Units). Quanto mais alto o índice SHU, mais ardente é o sabor do fruto. A mais ardente na escala é a Trinidad Scorpion Moruga Blend com SHU 2.000.000, enquanto a mais fraca é a poblano e a dedo-de-moça, ambas com SHU entre 1.000 e 1.500. A dedo-de-moça é originariamente brasileira, pouco ardida e possui um aroma suave. Quando desidratada e triturada em flocos, é conhecida como pimenta-calabresa.
VALOR ORNAMENTAL
Como se não bastassem o gosto marcante e todas as propriedades nutricionais, as pimentas ainda enfeitam o jardim, já que crescem em arbustos vistosos e muito ornamentais. Elas vão bem tanto em canteiros quanto em vasos, que podem ser mantidos na área externa ou dentro de casa – desde que recebam bastante sol.
Quando o objetivo é apenas enfeitar o jardim ou a casa, as pessoas geralmente recorrem às espécies Capsicum annuum e Capsicum baccatum var. pendulum, cujos frutos são muito vistosos. O que pouca gente sabe é que eles também são comestíveis. Um prato cheio – literalmente! – para quem gosta de ter temperos frescos sempre à mão. Os arbustinhos costumam ser vendidos em garden centers e não custam mais do que R$ 30.
Se você preferir iniciar o plantio a partir de sementes, o ideal é utilizar os grãos secos – vista luvas ao manipulá-los –, que devem ser depositados em um pequeno recipiente com substrato para mudas. “O melhor mês para fazer isso é agosto, para que a produção dos frutos ocorra na época mais quente do ano”, explica Marcelo Cury. Quando a muda estiver com 15 cm de altura, transplante-a para um espaço maior – prepare o substrato misturando sete partes de terra vegetal com três partes de esterco bem curtido.
Cerca de 100 dias após a semeadura, os frutinhos aparecem. A partir daí, a frutificação se mantém por cerca de sete meses, desde que todos os cuidados sejam devidamente tomados. Neste meio-tempo, trípes, ácaros e moscas-brancas podem perturbar a planta ocasionalmente. Em infestações pequenas, o controle pode ser feito com produtos naturais, como o óleo de Neem. Vale a pena cultivar as pimentas: seja para agradar ao paladar ou apenas para enfeitar o jardim.
PIMENTA PARA OS FORTES
A indiana ‘Bhut Jolokia’ é uma das pimentas mais picantes do mundo. Esteve no topo da escala de Scoville até 2011, quando foi desbancada pela australiana ‘Butch T Trinidad Scorpion’ (que também já perdeu o posto). No Brasil, os jolokianos – como se autodenominam os fãs dessa ardida – têm até um site oficial: www.jolokianos.com.br. Lá, eles postam vídeos das reações diversas que uma mordida na pimenta pode provocar em uma pessoa.
PIMENTA EM DETALHES
• Nome científico: Capsicum hybrid
• Nome popular: pimenta, pimentão, pimenta-ornamental
• Família: solanáceas
• Origem: plantas híbridas desenvolvidas a partir de espécies nativas do México
• Características: arbustos muito ramificados, de ciclos variados, normalmente bianuais
• Porte: o tamanho do arbusto varia de 30 cm a 1,5 m de altura, dependendo do espaço onde for cultivado
• Flores: têm cerca de 2 cm de diâmetro com cinco pétalas dispostas em forma de estrela. Podem ser brancas, róseas ou arroxeadas
• Frutos: mudam de acordo com a variedade. Podem ser amarelos, verdes, laranja, vermelhos e até arroxeados. Apresentam tamanho, formato e sabor diferentes
• Frutificação: começa cerca de 100 dias após a semeadura
• Luz: sol pleno
• Solo: arenoargiloso, acrescido de matéria orgânica, com pH 6
• Clima: a planta é típica de clima tropical, mas tolerante ao frio subtropical de baixa altitude, onde não ocorrem geadas
• Regas: diárias, sem encharcar a planta
• Plantio: Marcelo Cury, gerente de produção da Fazenda Ituaú, recomenda o plantio das sementes no mês de agosto, para que a frutificação ocorra no verão – e seja, consequentemente, mais proveitosa. Se mais de um exemplar for plantado na mesma área, deve-se manter 10 cm de distância entre as plantas
• Podas: somente as mudas cultivadas em vaso requerem podas. O corte deve ser superficial, apenas para controlar o tamanho da pimenteira
• Adubação: orgânica, com esterco curtido e húmus de minhoca a cada 20 dias ou química, com NPK-4-14-8 a cada 20 dias (não muito perto do pé da planta)
• Reprodução: por sementes